quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Abaixo o bullying homofóbico

Psicólogos aprovam material contra homofobia nas escolas
por Redação MundoMais



Enquanto há homofóbicos que reprovam o material sobre LGBTsdo Ministério da Educação sem ao menos tê-lo visto, oConselho Federal de Psicologia analisou-o e deu parecer favorável à sua utilização nas escolas.

Mesmo sem data para chegar aos colégios de ensino médio do país, o kit – formado por vídeos, guia de orientação para o professor e cartilhas – foi criticado em apresentação prévia naComissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados. Agora, o Conselho Federal de Psicologia entrou na discussão em defesa do material.

Dentre as razões apresentadas para a defesa está a importância do kit para enfrentar o bullying homofóbico e a possibilidade de pais, alunos e professores aprenderem a respeitar LGBTs com a ajuda dos vídeos e textos que integram a ação ministerial.

Uma comissão de psicólogos e especialistas avaliou o material para analisar a qualidade técnica, didática e pedagógica dos vídeos e textos e a adequação do conteúdo à faixa etária do público que o receberá. A previsão é de que 6 mil colégios tenham acesso ao material este ano. Para o CFP, os filmes e livretos que abordam conflitos de adolescentes em relação à sexualidade têm linguagem correta para os alunos que serão alvos do projeto e trata de forma cuidadosa os temas.

“Representa material de vanguarda, pois são instrumentos de capacitação e formação continuada para o próprio professor. O kit reforça a atenção e cuidado com os temas transversais da educação nas relações de ensino-aprendizagem, como no caso do respeito à diversidade sexual”, diz o relatório. A entidade diz que faz parte do compromisso profissional de qualquer psicólogo contribuir para reflexões sobre preconceito e o fim de discriminações sexuais.

O texto de cinco páginas começa justificando a importância da discussão do tema nas escolas, que têm a responsabilidade de formar cidadãos éticos e que respeitem as diferenças, segundo os psicólogos. “A discussão principal sobre o tema refere-se à necessidade de tratar preconceitos e discriminações que refletem uma violência (verbal, simbólica) reverberando nos espaços de convivência escolar”, afirma o texto.

De acordo com os psicólogos, faltam instrumentos de qualidade para que professores e orientadores trabalhem o tema em sala de aula. A iniciativa, para eles, é positiva. A entidade sugere ainda que outros setores, como redes sociais, desenvolvam projetos semelhantes para combater o preconceito.

O material foi elaborado em parceria com a Pathfinder do Brasil; a Reprolatina - Soluções Inovadoras em Saúde Sexual e Reprodutiva; e a ECOS - Centro de Estudos e Comunicação em Sexualidade e Reprodução Humana (São Paulo-SP), e conta com o apoio daAssociação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT); da GALE – Global Alliance for LGBT Education, e da Frente Parlamentar pela Cidadania LGBT do Congresso Nacional.

Fonte: mundomais






quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

ESTAMIRA: MISSÃO CUMPRIDA

Por LUIZ FERNANDO GALLEGO

O filme Estamira revela antes de mais nada o respeito à escuta do outro, do diferente, do estranho. Estranho que, entretanto, nos é familiar de alguma forma. Como não admirar - e concordar - com a frase dita por uma doente mental crônica segundo a qual "não existem mais ´inocentes´, mas sim ´espertos ao contrário´ " ?

Em uma cidade, um estado e um país mergulhados num sufocante lixo ético, o "lixão" de Gramacho, nem tão longe da decantada "Cidade Maravilhosa", se transforma numa metáfora deprimente do estado a que chegamos. Com humor que nos atenua as dores intoleráveis, o "Barão de Itararé" assim chamava o "Estado Novo" getulista: o estado a que chegamos. Como chamar o atual estado de coisas a que chegamos?

Não nos iludimos achando que os inúmeros traumas e vicissitudes pelas quais passou a personagem real que dá título ao documentário de Marcos Prado teriam sido "a causa" de sua doença mental. Sua mãe também necessitou de tratamentos psiquiátricos. Uma tendência desfavorável já a acompanhava geneticamente. Mas sua história de vida (que o filme vai desvendando aos poucos), sua especificidade e sua subjetividade - única e irreproduzível - estão inscritas em seus delírios, alucinações e modo de estar no mundo. Nada é gratuito, tudo é revelado, desvelado ou re-escrito na forma de Dona Estamira se apresentar. Seu discurso pode chegar a formular lições de sabedoria, mas, antes de tudo, expõe sua percepção peculiar de si mesma e do mundo em que nos encontramos: delirante e sábia, confusa e cristalina, atordoante e provocadora de reflexão.

Quando o fotógrafo Marcos Prado, ainda no ano 2.000, encontrou Dona Estamira no Lixão que ele fotografava, ela lhe teria dito que tinha uma missão: revelar "a verdade". Perguntou-lhe se sabia qual era a missão dele. Como ele não respondesse logo, ela anunciou: "Sua missão é revelar a minha missão".

Sem se furtar à profecia oracular, Marcos Prado aceitou o papel que a louca do "lixão" lhe apontou. Durante anos seguidos visitou repetidamente Estamira e seus filhos em casa assim como não deixou de ir filmar Estamira e seus companheiros, catadores como ela, no enorme e insalubre depósito de todo o lixo da cidade do Rio de Janeiro. Registrou cenas a cores com a iluminação natural; outras em preto-e-branco granulado quase chegando à desintegração da imagem; outras ainda em exemplar trabalho do fotógrafo que sempre foi. O pathos atingido pela apresentação áudio-visual é impactante, não podendo deixar de ser mencionada a presença apoiadora da exemplar trilha musical de Décio Rocha.

Incrível, no entanto, é constatar que esta é uma primeira obra para cinema. Em seu ritmo envolvente, seu diálogo com a entrevistada e a aproximação que vai fazendo gradualmente com a platéia, o filme é surpreendente em sua sintaxe, elegante em sua gramática, contundente na emoção evidente com a qual foi feito e que transmite em cada passagem.

Não cai na armadilha da idealização ingênua (nem há mais ingênuos, já anunciou o filme logo no início): Estamira pode se mostrar arrogante, verbalmente agressiva, até mesmo desagradável. Mas Marcos permite que ela se faça ouvir. E ao registrá-la faz com que escutemos sua revolta contra um "Deus estuprador" e contra médicos "copiadores" de receitas. Origens e meios são contestados e questionados. Anos depois do próprio cinema, hoje clássico, de Ingmar Bergman questionar o "silêncio de Deus" - e ainda antes do atual Papa tentar deslocar a responsabilidade dos homens para a ausência de Deus durante os horrores do Holocausto - Estamira, o filme e a personagem, denunciam o desamparo humano, não só filogenético ou ontogenético, mas também social, econômico e político. Assim como são questionadas as condições dos hospitais psiquiátricos, dos ambulatórios, dos tratamentos reduzidos à prescrição (ainda que adequada) de medicações potentes que podem até mesmo minimizar os abismos das psicoses, mas onde se corre o risco de deixar de lado a escuta do Outro, da alteridade - tudo isso e muito mais são expostos como um nervo vivo.

E o cineasta, sem proselitismo nem vassalagem, através de uma linguagem cinematográfica grave e comunicativa nos faz refletir muito mais ainda sobre uma realidade que nos parece insuportável de ser vivida, mas aonde a vida surpreendentemente se preserva da única forma que parece possível: louca. Como nos parece ensandecida uma das imagens finais do filme onde, ao longe, se vê o perfil deslumbrante dos morros do Rio de Janeiro, mas em primeiro plano nada mais do que o lixo. Muito lixo.

LUIZ FERNANDO GALLEGO é psicanalista e cinéfilo, curador da mostra 2008 sobre Cinema e Ética no setor Cultural da Escola de Magistratura do Fórum do Rio de Janeiro.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Ultrapasse a simples geração de idéias

"Existem pavões que escondem cuidadosamente sua cauda e esse procedimento os enche de orgulho."

Do livro: Além do Bem e do Mal, de Nietzsche.
É de fazer pensar...
Li esses dias essa frase, quando estava no onibus indo pra facul, e fiquei pensando no quanto nós escondemos a nossa cauda... No quanto alguma força maior fica a nos podar desta maneira. Neste sentido de não nos deixar ser...
Ah! As indagações são as mais diversas...
Cada um vai olhar isto de maneira diferente... xP

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

EM BREVE - Video debate


FACULDADE ESTÁCIO DE SÁ FLORIANÓPOLIS
PSICOLOGIA

Múltipla escolha

" Como raramente cumprimos esses mandados, já ao levantar de manhã nos acompanha a sensação de que algo está errado conosco: dúvida e frustração. Somos severos cobradores das nossas próprias ações. No esforço de realizar tarefas que talvez nem nos digam respeito, tememos olhar em torno e constatar que muita coisa falhou. Se falharmos, quem haverá de nos desculpar, de nos aceitar, onde nos encaixaremos, nesse universo de exitosos, bem-sucedidos, ricos e belos? Pois não se permite o erro, o fracasso, nesse ambiente perfeito. Duro dizer 'amei torto, ignorei meus filhos, falhei com minha parceira ou parceiro, votei errado, fracassei na profissão, não ajudei meu amigo, abandonei meus velhos pais e esqueci meus sonhos'."

Lya Luft

Outrem e liberdade

A comunicação na ideia ou a ação coletiva são de uma ordem completamente diferente da "proximidade absoluta entre o meu 'mim mesmo' e o do outro, em que nenhuma substituição é mais possível" (p.308)."Não posso me tornar eu mesmo sem entrar em comunicação, e não posso entrar em comunicação sem ser solitário" (p.313-314). O Eu sem comunicação não seria mais que ESCOAMENTO FRÁGIL, DESLOCAMENTO CAÓTICO ou BLOQUEIO VAZIO e IMÓVEL. Solidão e união significam igualmente uma certa dureza do Si e uma distância sempre a desaparecer e a renascer. A comunicação só rompe a solidão ao possibilitar, precisamente a partir daí, uma nova e possivelmente mais original RELAÇÃO.
É no esforço que faz a existência para atingir a certeza de ser ela mesma que se introduz mais insidiosamente a possibilidade do desespero. Querer ser livre para si só é cair numa das duas formas de desespero analisadas por Kierkegaard: querer desesperadamente ser si-mesmo, ou querer desesperadamente não ser si-mesmo. Na ideia do combate como situação-limite, como Agon espiritual (p.446), aparece também o combate sem violência, "o combate pela existência do amor" (p.453), que é questionamento de si e do outro sobre o fundamento de uma solidariedade invisível sem a qual não há existência virtual alguma. Só a liberdade, fonte de todo esclarecimento da existência, engajada nesse combate que só se sustenta por ele mesmo, e que, sem fundamento nem justificação conceitual, ajuda a "superar o desespero das situações-limite"(p.480), a não se obstinar no fechamento e na angústia.


Do livro: EXISTENCIALISMO, de Jacques Colette

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

1 ANO SEM NOSSO "BENDITO"

ALL IS SON...

SAUDADES DO NOSSO AMIGO...
E QUE ELE ESTEJA OLHANDO POR NÓS E EN-CANTANDO OS CÉUS...

domingo, 6 de fevereiro de 2011

UMA PEQUENA E ENTUSIASMADA REFLEXÃO PRIVATIVA

Se as pessoas, quando ouvissem algo de alguém ou vissem, estivessem com os olhos realmente abertos, e silenciasse um pouco o seu discurso interno e os ouvidos atentos poderiam ver e ouvir o outro lado, o que está além ou o que por algum motivo não é comunicado na linguagem que entendemos, com certeza estaríamos muito mais perto de um mundo melhor.

Nós futuros psicólogos já começamos a fazer isso?

Já conseguimos ter este ouvido, ter este olhar, calar?

E acima de tudo teremos?

É uma pergunta que devemos nos fazer e ir na direção dela, acredito eu.

Não acharmos que sempre o que ouvimos são fatos, podem não ser, podem ser simples interpretações de comunicações entendidas de uma forma, podem ser interpretações através de um aprendizado, esquecendo que ainda não aprendemos tudo.

Mas se abrirmos os braços para o entendimento, e deixarmos o que temos de mais profundo em nós brotar – O AMOR – tudo isso não passam de palavras vãs, porque o amor por si só o fará.

Com amor certamente entenderei melhor, abrirei os meus sentidos e estarei de braços abertos para o que quero, para o que preciso e com certeza o caminho é mais próximo.

De todas as minhas experiências cliente da exclusão, desde a fome e o frio até o deslumbre de ter e ser , a relação com o outro sempre é a que mais dói ou que mais dá prazer.

Sartre diz – O inferno são os outros. Mas o que fazemos com o outro para ele ser o inferno?

Penso que cada sessão de um terapeuta é única e de um cliente também, porque a cada sessão que passa nem terapeuta e nem cliente são mais os mesmos.

Valdete Coelho Sant´ana

Breve percurso pelo pensamento freudiano acerca do tratamento psicanalítico das psicoses

por
Marcos Esnal
Psicanalista; Auxiliar de docência na Facultad de Psicologia da Universidad Nacional de Rosario.  

O dia 21 de novembro de 1906, numa intervenção na Sociedade Psicanalítica de Viena, Sigmund Freud estabelecia o que ia se constituir no elemento central de sua posição a respeito do tratamento psicanalítico das psicoses, ao se referir, na ocasião, à paranóia: "Isto [a mobilidade da libido] não é possível na paranóia por causa da regressão ao auto-erotismo. O médico não encontra fé, não encontra amor. O paciente, da mesma maneira que uma criança, só acredita em quem ama" (Nunberg y Federn, 1979, p. 82). Esta afirmação é posterior ao fato de ter proposto, anos antes, a localização da paranóia no grupo das "neuropsicoses de defesa" (Freud, 1894), e estabelecido para ela o tratamento pela hipnose (método que a equiparava à histeria e à neurose obsessiva). A posição freudiana tinha mudado devido à não descoberta, nos paranoicos, da parte flutuante de libido que estabelecia as transferências (em 1906, ainda no plural) do paciente para com o analista.

Como é sabido, esta posição de Freud não mudou no decorrer de sua obra, à exceção de seu trabalho sobre A Gradiva de W. Jensen (1903), no qual, o modelo de interpretação do sonho o leva a propor uma simetria entre a posição de Zoe Bertgang a respeito de Norbert Hanold. Neste artigo, o delírio aparece como o modelo patológico da produção onírica, o que quer dizer que pode ser interpretado restabelecendo a relação do delirante com a realidade.3

Uma vez que, em 1912, Freud passa a utilizar no singular "a transferência", a inexistência da transferência nas psicoses torna-se para ele ainda mais patente. Esse fenômeno -o de que o paciente implicara ao analista na série parental de seus afetos e reminiscências-, perante o qual Freud se mostrava absolutamente surpreso por tratar-se de um acontecimento inesperado, não era presumível em quem amava seu delírio como a si mesmo. É a época do encontro de Freud com as Memórias de Schreber (Freud, 1911). A partir deste encontro torna-se possível (e necessário) introduzir o conceito de narcisismo, para poder explicar qual é o destino psicótico dessa libido flutuante presente nas neuroses: digamos que, para Freud, o delírio condensa aquela energia que está destinada ao analista como objeto no marco de uma psicanálise.

Em 1915, Freud publica os Trabalhos sobre Metapsicologia. Neles, ao referir-se ao destino das cargas de objeto ou libido objetal na esquizofrenia, ele explica que: "... o estudo da esquizofrenia nos impôs a hipótese de que, após o processo repressivo, a libido subtraída não procura nenhum novo objeto, mas que se retrai ao Eu, ficando assim suprimida a carga de objeto e reconstituído um primitivo estado narcisista, carente de objeto. A incapacidade de transferência destes pacientes, dentro da esfera de ação do processo patológico, sua conseqüente inacessibilidade terapêutica, sua singular repulsa ao mundo exterior, o surgimento de indícios de uma sobrecarga do próprio Eu e, enfim, a mais completa apatia, todos estes caracteres clínicos parecem corresponder à maravilha à nossa hipótese da cessação da carga de objeto. No que diz respeito à relação com os dois sistemas psíquicos, todos os investigadores comprovaram que muitos daqueles elementos que, nas neuroses de transferência, somos obrigados a buscar no inconsciente, através da psicanálise são conscientemente exteriorizados na esquizofrenia. Mas, no começo, não foi possível estabelecer, entre a relação do Eu com o objeto e as relações da consciência, uma conexão inteligível." (Freud, 1915, p. 194)

Na série de conferências de introdução à psicanálise aparecidas em 1917, Freud dedica uma à teoria da libido e o narcisismo e uma outra à transferência. Nelas refere-se à resistência oposta pelos psicóticos ao tratamento como "um muro que nos detêm" (Freud, 1917, p. 385) e resolve as dificuldades de sua abordagem no fim da conferência dedicada a "A transferência", dizendo que "são inacessíveis ao nosso empenho; não podemos curá-los" (Freud, 1917, p. 407).

Notou-se já (Allouch, 1986) que, em 1924, a metáfora do muro continuava vigente: "Em particular, desde que se começou a trabalhar no conceito de narcisismo, conseguiu-se lançar um olhar por cima do muro, ora neste, ora nestoutro lugar" (Freud, 1924, p. 57).

Em 1937, Freud extrai conclusões interessantes da comparação entre o delírio e as construções do analista no marco do tratamento das neuroses: "Muito amiúde, quando um estado de angústia faz [o neurótico] prever que algo terrível acontecerá, simplesmente está sob o influxo de uma lembrança reprimida que gostaria de acudir à consciência e não pode devir consciente: a lembrança de que aconteceu efetivamente algo terrível naquele tempo. Opino que tais empenhos com psicóticos terão de nos ensinar muito e coisas de grande valia, embora o sucesso terapêutico seja denegado a eles" (Freud, 1937, p. 269).

Se revisarmos um pouco este breve percurso, poderemos assinalar a gestação de diferentes conceitos muito caros à psicanálise e, ao mesmo tempo, ver como essa gestação seria impensável sem uma preocupação, por parte de Freud, com pensar o que ocorria, em termos metapsicológicos, nas psicoses. Pensemos, por exemplo, no conceito de Superego. Se bem este conceito reconhece suas raízes nos chamados diques anímicos dos Três ensaios de teoria sexual (Freud, 1905) e sua formulação específica em O Ego e o Id (Freud, 1923), é claro que a análise das idéias de perseguição que padece o psicótico -e das que Freud se ocupa em Introdução ao narcisismo (Freud, 1914)- representa um degrau fundamental na construção do referido conceito. É possível também pensar o quanto deve a teorização de Freud às psicoses em relação a outros conceitos chave: a distinção entre representação de coisa e de palavra, o esclarecimento do processo de luto, a distinção entre projeção "normal" e patológica etc.

Em resumo, digamos que a posição de Freud, dentro de um modelo pulsional binário, que supõe uma passagem do auto-erotismo ao narcisismo e no qual o estabelecimento da transferência depende da existência de um mínimo de libido flutuante capaz de se enlaçar à imagem do analista, aparece como lógica.

Para finalizar, podemos passar em revista algumas perguntas que atualmente orientam nossa pesquisa:

Que acontece na psicanálise para que, a partir dos anos quarenta, comecem a surgir trabalhos como os de Federn (1991), que propõem não só a existência da transferência nas psicoses mas as modificações que necessariamente devem se realzar no dispositivo analítico para que tenha lugar uma cura?

Que relação têm os impasses surgidos nestes tratamentos com os do próprio Freud?

Por que existe, nos analistas de orientação lacaniana (em qualquer uma das vertentes atuais da mesma), uma convicção inabalável que afirma que somente a partir das proposições de Lacan começou a se tornar possível o tratamento psicanalítico das psicoses?

A convicção anterior responde ao efeito imaginário de uma doutrina e ao desconhecimento do acontecido na psicanálise durante os anos quarenta e cinquenta, ou existem razões teóricas que a sustentam?

Caso se deva à segunda alternativa proposta, essas razões teóricas são as mesmas?


Fonte:http://www.proceedings.scielo.br/scielo.php?pid=MSC0000000032001000300026&script=sci_arttext







sábado, 5 de fevereiro de 2011

5 tratamentos psiquiátricos bizarros que caíram em desuso

por Ana Carolina Prado
24 de novembro de 2010

Até que se entendessem as doenças mentais, muita coisa absurda já foi feita para dar um jeito nos loucos. De choque térmico por infecção pelo protozoário da malária (!) a perfurações no crânio (ambos tendo rendido o Prêmio Nobel a seus criadores!), listamos 5 “tratamentos” bizarros já usados para curar males psiquiátricos.

1- Infecção por malária



Estamos nos anos 30 e a sífilis, incurável nessa época, é a maior causa de demência no mundo. Ninguém sabe o que fazer com tanta gente paranóica, violenta e incontrolável nos manicômios. Mas aí o médico austríaco Julius Wagner von Jauregg observou que, quando essas pessoas contraíam alguma doença que provocasse episódios de febre alta e convulsão, a loucura ia embora. O que o doutor Julius fez, então? É. Ele colocou o sangue contaminado de um soldado com malária em nove pacientes com paresia crônica, a demência que ocorre em um estágio avançado da sífilis, para que elas contraíssem febre alta e tivessem convulsões. O resultado foi impressionante e até lhe rendeu um Premio Nobel em 1927: ele conseguiu recuperação completa em quatro desses pacientes e uma melhora em mais dois. “Parece absurdo dar o Prêmio Nobel a alguém que infectava os pacientes com a malária, mas o desespero na época era muito grande”, diz Renato Sabbatini, neurocientista da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Esse tratamento, obviamente, era muito perigoso (você melhorava da loucura, mas ganhava a malária de presente) e deixou de ser usado nos anos 60, com a descoberta de antibióticos e medicamentos próprios para problemas mentais.

2- Terapia por choque insulínico



Em 1927, o neurologista e psiquiatra polonês Manfred Sakel pesou a mão na dose de insulina que aplicou em uma paciente diabética (que era, dizem, uma cantora lírica famosa na época) e ela entrou em coma. Mas o que poderia ter sido um desastre virou uma bela descoberta: a mulher tinha psicose maníaco-depressiva e obteve uma notável recuperação de suas faculdades mentais. Então Sakel descobriu que o tratamento era eficaz para pacientes com vários tipos de psicoses, particularmente a esquizofrenia. “Esta foi uma das mais importantes contribuições jamais feitas pela psiquiatria”, diz Sabbatini. A técnica passou a ser usada em todo o mundo, mas o entusiasmo inicial diminuiu depois que estudos mostraram que a melhora era, na maioria das vezes, temporária. Sem contar, é claro, que era extremamente perigoso. Assim, esse tratamento também caiu em desuso após a descoberta de medicamentos mais adequados.

3- Trepanação



Achados arqueológicos mostram que a trepanação, cirurgia em que era aberto um buraco (geralmente de 2,5cm a 3,5 cm de diâmetro) no crânio das pessoas, já era feita em várias partes do mundo 40 mil anos atrás. A cirurgia era realizada em rituais religiosos para liberar a pessoa de demônios e espíritos ruins – quando, na verdade, ela era vítima de doenças mentais. Até hoje é realizada por algumas tribos da África e da Oceania para fins rituais e em alguns centros modernos de neurologia para aliviar a pressão intracraniana em caso de fortes pancadas na cabeça, por exemplo. Mas não só. “Se esse procedimento for feito por algum outro motivo, isso é bizarro e perigoso”, afirma Sabbatini. Mas existem organizações hoje que defendem essa técnica “como forma de facilitar o movimento do sangue pelo cérebro e melhorar as funções cerebrais que são mais importantes do que nunca para se adaptar a um mundo em cada vez mais rápida evolução”. Isso é o que diz o site de um grupo internacional em defesa da trepanação, que defende que qualquer pessoa que deseje melhorar suas funções mentais e sua qualidade de vida deve poder realizar o procedimento.

4- Lobotomia


Os cirurgiões americanos Walter Freeman e James Watts, que aperfeiçoaram a técnica da lobotomia.

A trepanação deu origem a outro procedimento macabro: a lobotomia, incisão pequena para separar o feixe de fibras do lobo pré-frontal do resto do cérebro. Como isso provoca o desligamento na parte das emoções, pessoas agitadas se acalmavam como se tivessem tomado tranquilizantes. Essa técnica, criada pelo neurologista português Antônio Egas Moniz, foi realizada pela primeira vez em 1935 e também lhe rendeu um Nobel, em 1949. Os resultados foram tão bons, que a lobotomia começou a ser usada em vários países como uma tentativa de reduzir psicose e depressão severa ou comportamento violento em pacientes que não podiam ser tratados com qualquer outro meio (na ocasião, não havia muitos). O problema é que a técnica, que deveria ser o último recurso, passou a ser usada maciçamente nos manicômios para controlar comportamentos indesejáveis – inclusive em crianças agitadas e adolescentes rebeldes. Entre os anos de 1945 e 1956, mais de 50,000 pessoas foram sujeitas a lobotomia no mundo inteiro. E os efeitos colaterais eram horríveis: a pessoa virava um vegetal – sem emoções, apáticas para tudo. Com o aparecimento de drogas efetivas contra ansiedade, depressão e psicoses, nos anos 50, e com a evidência de seu abuso difundido e efeitos colaterais, a lobotomia foi deixando de ser usada.

5- Mesmerismo



O médico austríaco Franz Anton Mesmer acreditava ser possível aliviar sintomas clínicos e psicológicos passando imãs sobre o corpo de seus pacientes – procedimento conhecido como mesmerismo. “Mesmer acreditava que os fluidos do corpo eram magnetizados e que muitas doenças físicas e mentais eram causadas pelo desalinhamento desses fluidos. Ele também achava que era possível obter os mesmos resultados sem os imãs, passando apenas as mãos sobre o corpo do paciente”, explica o professor de psicologia Renato Sampaio Lima, da Universidade Federal de Sergipe (UFS). Ahhh, o poder da sugestão. Era tudo picaretagem. Ou efeito placebo, para ser mais exato. Esta arte de cura disseminou-se entre outros praticantes no século XVIII e chegou aos Estados Unidos no início do século XIX. Mesmer foi expulso de vários países e cidades porque não conseguiu provar a eficiência do seu método, mas ganhava uma grana dos crédulos. “Em todos os lugares em que ele foi, a comunidade médica o repudiou. Ele pegava madames com doenças psicossomáticas leves, fáceis de tratar com placebo, e baseava o seu prestigio nesse efeito”, completa Sabbatini. O suposto sucesso não dependia das técnicas usadas, mas no seu poder de persuasão. Após muitas críticas, a prática do mesmerismo caiu em desuso no início do século XX.
fonte: super.abril.com.br

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

"Psicólogos Transgênicos" no orkut

Quando surgiu nos EUA, em 2004, a rede de relacionamentos ORKUT, tornou-se a maior “febre” principalmente entre brasileiros. O site em questão viabiliza encontro de pessoas com interesses em comum, reencontro de antigos amigos, fóruns e comunidades focadas nas mais diversificadas temáticas e categorias,


sejam grupos musicais, arte e cultura, profissões, ideologias, gostos pessoais. O pior dos profissionais da área da psicologia também estão presentes no orkut divulgando serviços dos quais os mesmos não estão habilitados.

Para o desespero do GreenPeace, surgiram os grãos geneticamente modificados, conhecido como transgênicos (...mas essa não é minha área de conforto). Em relação à Classe dos Psicólogos brasileiros surge a nova praga virtual na área Científica: os “Psicólogos Transgênicos”.

Quem são os “psicólogos transgênicos virtuais”?
São uma espécie de recém-formados (e desinformados) com suas práticas psicológicas pra lá de duvidosas alterando e burlando qualquer Regulamento, Legislação imposta pelo Conselho Federal e Regional de Psicologia, sem um mínimo de responsabilidade ética e social. Geralmente montam páginas eletrônicas na Internet do dia pra noite, como por exemplo, blogs, hospedam seus sites em provedores gratuitos e/ou pagos e fazem sua divulgação e autopromoção pessoal em diversos fóruns do orkut, conhecido como o spam (mensagens publicitárias não solicitadas). É isso que esses “profissionais psicólogos transgênicos virtuais” estão fazendo sem a mínima noção de ética e bom senso. Afrontam Regimentos, Resoluções e o Código de Ética do Profissional Psicólogo. A grande parte deles são acadêmicos, recém-formados em Psicologia interessados na autopromoção pessoal.

“Psicólogos Transgênicos” costumam abrir, moderar e abrir tópicos em dezenas de comunidades, criam perfil FALSO no ORKUT promovendo seus blogs, sites pessoais e/ou serviços não qualificados prestados por eles. Os mesmos se cadastram em diversos fóruns, principalmente comunidades relacionados à problemas comportamentais, aonde é possível encontrar clientes em potencial, ou seja, esses “psicólogos” se aproveitam da fragilidade dos internautas participantes dos fórum para atendê-los online. Aliás, esses “profissionais” recebem sugestões de amigos e idéias aonde os mesmos possam divulgar seus blogs e sites pessoais sobre as orientações psicológicas online em fóruns sobre problemas amorosos, depressão, transtornos alimentares, principalmente fóruns de preconceitos religiosos e sociais. Isso é praxe!

É mais fácil identificarmos um “Psicólogo Transgênico” do que um grão geneticamente modificado escondido em sacas e toneladas de cargas... diga-se de passagem... as duas coisas fazem mal à sua saúde. Identificar um profissional de credibilidade do outro que é uma fraude, basta aprendermos separar o grão saudável do intragável.

Vamos aos fatos: essa terminologia “Psicólogos Transgênicos Virtuais” (ou “Psicólogos Piratas”) foi adotada para ajudar aos orkuteiros de plantão (freqüentadores do ORKUT) dos quais são as maiores vítimas desses “psicólogos”. Primeiramente nós psicólogos NÃO FAZEMOS PUBLICIDADE NO ORKUT, QUANTO MAIS SPAMS EM DIVERSOS FÓRUNS REFERENTES À PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE ORIENTAÇÃO PSICOLÓGICA ONLINE OU PRESENCIAL, MUITO MENOS MODERAMOS FÓRUNS VINCULADOS ÀS ORIENTAÇÕES PSICOLÓGIAS ONLINE.

Não é difícil achar “psicólogos” e aventureiros praticando orientações psicológicas online, orientação vocacional e terapias sexuais no orkut sem devida habilitação e Selo eletrônico de Credenciamento do Conselho Federal de Psicologia, seja dentro ou fora do ORKUT.

Alguns “psicólogos transgênicos” se intitulam “Doutores” para dar mais crédito à sua prestação de serviço do qual só possui título de graduação ou nem mesmo a conclusão da faculdade de psicologia exigida pelo MEC para exercer a Profissão de Psicólogo. Outros nem mesmo fazeram faculdade de psicologia e estão se beneficiando (e muito) da prática ilegal.

Devido a impunidade dos sites que prestam tais serviços ilegais de psicologia, a tendência dos serviços de orientação online já é banalizado devido a falta de fiscalização e demora no processo para punição desses “Psico-Transgênicos”. Existem diversos blogs e sites de procedência duvidosa que fazem suas autopromoções pessoais e publicidades ilegais no ORKUT, deturpando a profissão Psicologia. Psicólogo não faz autopromoção e não presta serviços por meios de scraps no ORKUT, muito menos abrem comunidades na rede de relacionamentos. ORKUT é entretenimento. Não é ambiente de trabalho muito menos setting terapêutico.

Quero frisar que não é ilegal a participação de psicólogos em comunidades, nem a aquisição de perfil na rede de relacionamentos do Orkut. A falta de ética está na autopromoção pessoal por meio de spam em comunidades, bem como a habilitação de perfis falsos.

Com tantos “psicólogos transgênicos” espalhados no orkut, logo teremos clientes reais (embora virtuais) desacreditados na qualidade da prestação de serviços de psicologia no Brasil, e o pior: ao invés de obtermos melhoras na qualidade de vida da população inseridos na cibercultura, vamos obter “melhoras e resultados terapêuticos transgênicos”. Essas pragas de “psicólogos transgênicos” plantadas nos hectares cibernéticos são (e serão) uma epidemia nas veias da Rede Mundial de Computadores unidos na depredação da qualidade dos serviços de orientações psicológicas online realizados por profissionais competentes a título nacional e por que não dizer a título mundial? Já que estamos falando de um mundo sem fronteiras.

Se algum “psicólogo” divulgar serviços de orientação psicológica online no orkut, em fóruns e comunidade com a prática de spam, desconfie... ou melhor... denuncie!

Uma coisa é certa: quem planta vento, colherá tempestade e no mínimo um processo ético.

Autor: Márcio Roberto Regis (CRP 08/10156)
Editor-Chefe do Portal de Psicologia Atlaspsico
Bacharel e Psicólogo formado pela Universidade Tuiuti do Paraná
Email: atlaspsico@atlaspsico.com.br – cel.: 41.9917.4556

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Marco Aurélio Ferraz: "Rompendo Silêncios: alunos especiais narram suas histórias"


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Costurado pela analogia ao mar e seus mistérios, navego no
movimento de idas e vindas, sem um porto estável onde aportar.
A Nau dos Insensatos que inspirou a introdução do referido projeto, é descrita por Michel Foucault em “A História da Loucura” (1961) e tem o mesmo sentido que as Naus dos loucos ou insensatos da Idade Média, “navios que carregavam insanos em
busca da razão”, um estranho barco que deslizava pelos rios e mares, levando uma carga insana, partia sem um rumo definido. Os tripulantes embarcavam em uma viagem sem fim, flutuando num mar sem fim, sem bordas, sem ancoragem.

Os alunos das escolas especiais, diferente dos loucos da Idade Média, foram nomeados Portadores de Necessidades Educativas Especiais e estão sendo “convidados” a embarcarem em uma Nau, em sentido metafórico, para um lugar pré-determinado, a escola regular, e, como os insensatos do início da modernidade, não escolheram partir nesta viagem, o convite para essa travessia foi feito por estranhos.

Ao chegar neste novo lugar, a escola regular, talvez sejam recebidos como estrangeiros, pois seu jeito de comunicar- se e aprender, são distintos. Alguns deles com seus corpos marcados são mais diferentes que os diferentes daquele lugar.

Com os estudos, tenho observado que o movimento dos alunos com deficiência mental, entre os fenômenos da inclusão e exclusão na escola regular e/ou na escola especial, tem tido visibilidade. É notório o aumento da clientela. Observando dados da vida escolar dos alunos, percebo que sua vida escolar é repleta de momentos onde os fracassos aparecem em destaque, obscurecendo de alguma forma as pequenas conquistas.

Por fazer parte como professor deste universo, considero fundamental explicitar as trajetórias pelas quais tem passado a Educação Especial e destacar suas crises na perspectiva de compreender as especificidades com as quais nos
deparamos no ato de educar como na atual conjuntura em que os educadores especiais mobilizam-se para discutir o futuro da escola especial, diante da concretização de algumas ações do Ministério da Educação através da Secretaria de Educação Especial.

Considero um momento importante para expor o trabalho que venho desenvolvendo em três escolas: uma escola especial, uma escola regular com um processo de discussão quanto a inclusão de alunos com Necessidades Educativas Especiais, bastante avançado e com um número considerável de alunos já incluídos e uma escola onde funciona uma Sala de Integração e Recursos.

Não pretendo apresentar novas verdades, pois acredito que elas não existam, mas refletir sobre novas perspectivas que os Estudos Culturais permitem para tratar um tema tão importante como é a inclusão, vista neste projeto sob a ótica dos próprios alunos.

Inspirado pelas idéias de Michel Foucault, permito-me identificar esses alunos com os chamados anormais, considerando a busca insistente de colocá-los em uma determinada norma que os capture, que lhes normatize, para com isso conduzi-los à
normalidade.
Pronunciado no Collége de France, de janeiro a março de 1975, o curso sobre “Os Anormais” dá continuidade às análises que Michel Foucault consagrou a partir de 1970, aprofundando questões como saber, poder, normalização e biopoder. É a partir
de múltiplas fontes, jurídicas e médicas, entre outras, que Foucault aborda o problema desses indivíduos “perigosos” que no século XIX eram chamados de “anormais”, destacando a formação de um saber e de um poder de normalização. A partir dessa
discussão poderia dizer que esses eram os indivíduos que de uma forma ou outra escapavam a uma norma, porém, eram capturados por outras, considerando que ninguém escapa a norma. Segundo o mesmo autor são três as figuras principais de caracterização dos anormais: os monstros, os incorrigíveis e os onanistas.

Sendo assim o indivíduo considerado anormal é aquele que segundo o referido autor deriva-se ao mesmo tempo da exceção jurídico-natural do monstro das multidões, dos incorrigíveis, detidos pelos aparelhos de adestramento, e do universal secreto das sexualidades infantis.

Na lógica de uma reflexão atual sobre a sociedade e o princípio de exclusão, ainda percebendo o quanto os discursos dos alunos da Escola Especial, estão envoltos nestas lógicas, reporto-me a época da alta Idade Média, na oposição razão e loucura. “O louco é aquele cujo discurso não pode circular como o dos outros”. Hoje os alunos com necessidades educativas especiais, poderiam ser facilmente comparados aos loucos da Idade Média, pois o olhar a eles lançado ainda é de estranheza, ainda é preciso romper as barreiras do silêncio, das palavras ingênuas, para que os mesmos possam ter na expressão desses discursos, as suas idéias compreendidas.

Pode ocorrer que sua palavra seja considerada nula e não seja acolhida, não tendo verdade nem importância, não podendo testemunhar na justiça, não podendo autenticar um ato ou um contrato, não podendo nem mesmo no sacrifício da missa, permitir a transubstanciação e fazer do pão um corpo; pode ocorrer também, em contrapartida, que se lhe atribua, por oposição a todas as outras, estranhos poderes, o de dizer uma verdade escondida, o de pronunciar o futuro, o de enxergar com toda ingenuidade aquilo que a sabedoria dos outros não pode perceber. (Focault.1970. p.11)

Apesar de considerar que o conceito de loucura aproxima-se muito mais da Doença Mental do que da Deficiência Mental, este termo é utilizado no texto como elemento de costura no resgate histórico das posições tomadas, em nome da normalidade, o que de fato aproximaria os indivíduos aqui estudados das duas
vertentes.

Em “A História da loucura” por exemplo, Foucault revela a trajetória dos muitos séculos, durante os quais a palavra do louco não era ouvida e se ouvida, o era com ouvido que a filtrava como dotada de uma razão ingênua ou astuciosa. O primeiro passo no estudo independência da condição da deficiência e doença mental ocorreu noinício do Século XIX, quando se estabeleceu a diferenciação entre idiotia e a loucura. Existe uma tendência mundial de estar reconhecendo o termo Doença Mental como transtorno Mental e Deficiência Mental como deficiência intelectual como um discurso diferente, do lugar de quem poderia exercer uma razão mais razoável do que a das pessoas razoáveis. Por volta do século XVIII a palavra dos loucos passa aser o mecanismo pelo qual era reconhecida sua própria loucura, então o que era dito é observado como e por que era dito, essa palavra passa a fazer a diferença.

A escolha de pesquisar alunos com deficiência mental é fruto da minha experiência na Escola Municipal Especial, onde a ênfase de atendimento se dá para este tipo de aluno. Essa escolha também se deve por verificar que os campos de pesquisa na educação inclusiva, tanto para alunos cegos quanto para surdos ou superdotados, tem se dado em um outro patamar de discussão devido se estar, na maioria das vezes, lidando com situações onde as constituições cognitivas estão preservadas, o que de certa forma não é o caso dos alunos com deficiência mental.

A pesquisa está fundamentada no princípio de que a partir de situações em que mais do que ouvir as vozes dos alunos, será necessário permitir o aparecimento da pluralidade dos discursos e do conjunto de enunciados que poderão ser evidenciados,
trazendo consigo um certo número de efeitos de poder Apesar de ser uma discussão importante quanto ao processo de inclusão, na
dissertação não aponto o interesse da busca de um lugar para os incluídos, mas um espaço de autoria. No desenvolvimento da pesquisa os alunos envolvidos entram como co-autores, pois me emprestam relatos de suas histórias de escolaridade, e é a partir
delas que estou compondo um conjunto de textos que analisados dentro de metodologias que consideram os diversos discursos que lhes dão sentido, posso apresentar algumas certezas, mas muito distantes de serem consideradas verdades, por dois motivos: um por que toda verdade pode ser relativizada quando atravessada pela cultura, principalmente em nossa linha de pesquisa em Estudos Culturais e outro por que as certezas que apresento, são indicadores de possibilidade para pesquisa que desenvolvo.
Nas observações realizadas, no trabalho com alunos da escola especial, tenho percebido que a comunicação, é um processo importante nas relações escolares.

Verifiquei que nas diversas situações, que envolvem os alunos, sempre esses tiveram algo para ser dito, seja em gestos, pequenas vocalizações, através de desenhos ou com a própria fala.
As situações cotidianas levam-me a perceber melhor que processos de comunicação incompreendidos, desencadeiam problemas e conflitos entre os alunos, professores, funcionários e famílias. Na maioria das vezes esclarecidas através de um
desenho, gestos ou falas. Questões que exigem a armação de cenas de escuta, através das quais realizamos importantes aprendizagens. O exercício da constituição de espaços
de fala na escola, fizeram-me refletir sobre a necessidade de ouvir os alunos no processo de inclusão.

A inclusão tem sido foco de discussão em diversos fóruns, com a participação de educadores, legisladores, famílias e outras tantas pessoas interessadas pelo assunto. No entanto passei a observar que faltava nestes fóruns a fala dos alunos. Tal situação
começou a fazer parte de minhas inquietações, perguntava-me: por que os alunos não são chamados a falar?. Será pela crença de que por serem deficientes mentais suas opiniões seriam teoricamente desprovidas de certa racionalidade, o que tornaria de
imediato sua fala sem sentido? Por essa fala não estar inscrita, em um padrão de normalidade, estaria em uma outra ordem do discurso, que não a esperada por quem faz as leis? Se considerarmos que há então um discurso capaz de contribuir para a qualificação do processo de inclusão, como dar visibilidade a este discurso? Alguns pontos de convergência me levam a estruturar minhas abordagens levando em consideração a importância e imergir no interior das relações escolarizadas
dos envolvidos na pesquisa, vivenciar o cotidiano de suas relações com a escola e com o processo de inclusão, para através da escuta dos discursos e enunciados, retornar a minha perspectiva de pesquisador, utilizando para isto a possibilidade de registro a
partir das histórias da vida escolar e principalmente dos discursos dos alunos. Refiro-me aos relatos que já tenho recolhido durante o processo de escrita, onde desenhos dos alunos são como subsídios. Para aqueles que já tiveram experiências no Ensino regular, é proposto que desenhem a escola de onde vieram e a escola especial, fazendo comentários sobre os desenhos, falas muito significativas têm acompanhado esses desenhos o que tem definido, de certa forma a necessidade de anexá-los ao projeto e
conseqüentemente justifica usá-los como ilustração no pôster a ser apresentado.